Meu Caro,
Paganini Escreveu:Ora cá estamos nós numa tarde de Domingo de Sanjoaninas na Ilha Terceira, terra de imortais aficionados e heróico patriotismo em tempos passados, presentes e com toda a certeza futuros.
Mas por incrível que pareça, o motivo pelo qual me proponho a escrever estas simples, e porventura pobres linhas, não se prende com as minhas amadas Sanjoaninas.
Trata-se sim, do sentimento de dever e obrigação, enquanto alma lusa, que se me apoderou a quando da leitura das bonitas e bastante rendilhadas - diga-se de passagem - palavras que um ilustre e não menos digno tecnocrata (por detrás do nick DataShark) proferiu neste mesmo fórum de discussão.
Mas como diria o outro, indo directo ao que interessa. As condicionantes certamente impostas pela minha hipotética limitação intelectual - sim, porque não tenho qualquer dúvida de que a intelectualidade pura reside do outro lado da "barricada" - fazem com que mais não possa do que interrogar-me(lhe) sobre que legitimidade tem o nosso ilustre para falar de "Direitos, Liberdades e Garantias".
Será que é o original autor da feliz expressão ou simplesmente um atento consumidor de sensacionalismo noticioso? Ou será que se trata de um ilustre desconhecido a quem coube a (in)felicidade de ser submetido a uma lavagem cerebral baseada em algum manual de cumprimento rigoroso?
Quando é a própria personagem a tentar dissuadir um argumento bastante fundado e com substancialidade óbvia quando refere (e bem) que a identidade nacional não se resume às Corridas de Touros, e dois metros para diante tropeça num grande "cascalho" e espalha-se ao comprido afirmando que o aborto não tem nada a ver com o que se está a discutir.
Então interrogo-me eu, onde estão os Direitos, Liberdades e Garantias de uma criança inocente que é assassinada antes de nascer? Será esta prestigiada e tão bem falante personagem que os defende? Se calhar deveria faze-lo antes de marcar a sua posição com insinuações redutoras e de conceito pré definido pela sua própria corrente ideológica.
Para começar deixe-me que lhe diga, que a falta modéstia lhe fica mal dado que em matéria de
"bonitas e bastante rendilhadas palavras" o amigo não fica nada atrás...
Em segundo lugar deixe-me que lhe diga que tomo o atributo de "tecnocrata" como o mais puro insulto!
Para mim ser tecnocrata significa ter uma visão calvinista e determinista, para não dizer desalmada, do mundo e reger-se não por princípios mas por regras mais ou menos deterministico-conjunturais, para não dizer "politicamente correctas".
Mas indo ao cerne da questão certamente que leu o meu
"post" original um bocadinho na diagonal, e isto para ser simpático para consigo...
Se o tivesse lido com atenção, certamente que teria notado que em momento algum referi que o Aborto não tinha nada a ver com a questão da Identidade Nacional.
Aquilo que eu disse, e lhe reafirmo, é que colocar no mesmo patamar duas problemáticas de tão diferente magnitude, é não só um perfeito disparate como extremamente redutor - nomeadamente no que diz respeito à questão do Aborto - problema o qual, sem sombra de qualquer dúvida, é infinitamente mais importante - como explícita e implicitamente acaba por reconhecer na sua prosa - e levanta mais questões do que qualquer questiúncula tauromáquica. A sua incapacidade em perceber esse facto é tanto mais lamentável quando suspeito que até partilhamos, no que diz respeito ao aborto, posições bastante similares...
Paganini Escreveu:E porque já me alonguei o suficiente nesta humilde exposição, fico por aqui, na esperança de um dia ter a oportunidade de me sentar à mesa, frente a frente, com este ou qualquer outro tecnocrata e detentor da verdade e razão absolutas, para, ponto por ponto, argumento por argumento, apresentar os factos que dissimulam toda e qualquer dúvida que possa existir!
E só para concluir, meu caro amigo - sim, amigo porque compatriota não lhe posso chamar -, tenha tento na língua quando invocar esta arte secular. A Identidade Nacional não são só as Corridas de Touros, mas são sobretudo as Corridas de Touros.
Meu Caro,
Mais uma vez, não julgue quem não quiser também ser julgado...
Quem avoca a si a capacidade (dívina aliás) de rebater
"ponto por ponto",
"argumento por argumento" assim como a capacidade de
"apresentar os factos que dissimulam toda e qualquer dúvida que possa existir" não sou eu...
Eu, no que me diz respeito, limitei-me a exprimir uma opinião, naturalmente sujeita ao exercício do contraditório e nada mais.
Quanto ao
tento na língua, rogo-lhe que antes de escrever ou proclamar em público seja o que for, e dizendo sempre o que pensa, pense sempre -antes- naquilo - e nas consequências daquilo - que diz...
Se estivéssemos a discutir teologia, seria forçado a dizer-lhe que tinha cometido grave heresia - passível de excumunhão automática.
A
Identidade Nacional também são concerteza as corridas de touros mas é sobretudo a nossa memória colectiva, é a nossa Língua, somos todos nós!
Dizer que a Identidade Nacional
"são sobretudo as Corridas de Touros" não só é infinitamente redutor como pode até ser considerado como traição à Pátria: podiam haver corridas de toiros sem que Portugal existisse (há-as em Espanha, no México e afins...) mas não podiam haver corridas de toiros
"à Portuguesa" sem que antes existisse Portugal!
Isto pode-lhe parecer um mero jogo de palavras mas não o é : Não são as corridas de toiros que dão carácter a Portugal,
Portugal é que deu e dá carácter às corridas de Toiros.
Mas, mais, até os "abomináveis" adversários das corridas de toiros ajudam a dar "carácter" às mesmas! Se não tivessem exercido o seu direito legitimo ao longo dos séculos de discordar, talvez não tivéssemos hoje a tourada, o toureio e a lide "à Portuguesa" tão peculiar e muito mais bela e nobre do que a Espanhola...
Por isso, da próxima vez que se arvorar em defensor impiedoso e sarcástico da Identidade Nacional, por favor pense, e pense em Portugal!
E se por ventura, e mesmo assim, o melhor que vê de Portugal são apenas, e só, as Touradas, então deixe-me que lhe diga que também eu não o posso tratar por compatriota porque certamente não vivemos no mesmo País...
Paganini Escreveu:Caso o meu amigo não saiba, o país construiu-se com as mãos do povo, aquele que trabalhava pelo pão nosso de cada dia e com as suas próprias mãos instituiu e consolidou esta arte. E ao menos para com esses que mais não pedem do que um merecido reconhecimento, tenha respeito e respeite o país que o viu nascer (se é que nasceu cá). Duvido muito!
O País, meu caro, construíu-se com sangue suor, muitas vidas e muitas lágrimas, e também pelo respeito pelas ideias e opiniões dos outros...
Apenas nos dois ou três momentos históricos em que isso não aconteceu é que a Pátria regrediu e muito...
O seu tom, desculpe a franqueza, faz-me lembrar aquele triste episódio da nossa História onde D. Manuel I (ironicamente para fazer um frete aos Reis Católicos de Espanha por via de uma casamento que nunca se veio a realizar (uma queda de um cavalo...)) decide expulsar todos os Judeus residentes no Reino. Com tal acção não só se municiou a Flandres, que mais tarde veio a arrasar boa parte do Império, como provavelmente se impediu que a Revolução Industrial ocorre-se aquí dois ou três séculos mais cedo, e quem sabe talvez hoje até os americanos falassem Português...
Tanta presunção, tanta certeza, tanta convicção, tanta raiva e cinismo não lhe ficam nada bem, e essa falsa humildade - tão arrogante, tão Salazarista - ainda lhe ficam pior...
O Mundo não foi, não é nem nunca há-de ser a preto e branco e essa sua postura, monocromático, maniqueísta e puramente simplista está mais próxima da dos verdadeiros e puros tecnocratas do que você parece julgar...
Paganini Escreveu:Não podia ficar sem resposta...
Certamente que não!
Termino, não com o "Conde de Abranhos" do Eça, não com Bretch, mas com uma simples frase de S. Tomás de Aquino:
"Quem age objectivamente bem mas contra a sua consciência então não agiu bem porque não reconhece o Bem enquanto tal"...
Se não percebeu também não faz mal porque então Graças a Deus o
meu Portugal também não é o seu...